A integração dos planos de gestão de recursos hídricos com a política de saneamento é fundamental para ampliar a oferta de água e o tratamento de esgoto em todas as regiões do país. Além do desafio de garantir o acesso de água potável e saneamento, é preciso também incentivar o reúso não potável de recursos hídricos pela indústria, além da elaboração de planos para lidar com a escassez de água e as mudanças climáticas, como forma de assegurar a segurança hídrica da população.
A avaliação foi feita nesta segunda-feira (20) pelos participantes da terceira audiência pública promovida pela Comissão de Meio Ambiente (CMA) para avaliar a Política Nacional de Saneamento Básico, instituída pela Lei 11.445, de 2007. O debate teve como tema o “uso racional das águas e das potencialidades do Brasil: uma análise das políticas de infraestrutura e dos serviços de gestão de recursos hídricos”.
Autor do requerimento da audiência pública, o senador Confúcio Moura (MDB-RO) disse que as audiências públicas servirão para conclusão do relatório de avaliação da política de saneamento, que deve ser apresentado pela CMA em dezembro. Em 2016, a Lei 13.329 introduziu o Regime Especial de Incentivos para o Desenvolvimento do Saneamento Básico (Reisb), com o objetivo de aumentar os investimentos na área em troca de concessão de créditos na cobrança de tributos. Transcorridos treze anos, a política nacional foi atualizada pela Lei 14.026/2020, novo marco legal do saneamento básico.
“Estamos em 2023 e os agravos da pandemia de covid-19 escancararam a lentidão dos principais indicadores. Está claro que o Brasil está longe de atingir as metas. O ranking anual, elaborado com base nos dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), de 2020, publicado em 2021, identificou mais de 100 milhões de brasileiros sem acesso à coleta de esgoto e cerca de 35 milhões de pessoas sem água tratada”, ressalta Confúcio Moura no requerimento do debate (REQ 20/2023 – CMA).
Superintendente de Regulação de Usos de Recursos Hídricos da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), Marco José Melo Neves disse que o novo marco legal do saneamento “avançou muito”, principalmente no que diz respeito à estruturação de blocos para tornar a infraestrutura de saneamento compartilhada de uma forma regionalizada, com soluções para água, esgoto e resíduos sólidos.
— O Brasil tem potencial e água para produzir, gerar riqueza, renda e emprego. A água tem um papel de geração de renda e de crescimento da economia, que vai redundar no crescimento de emprego e bem-estar social. Um país rico em água tem também potencial para gerar emprego e renda em produtos que dependem da água para a sua produção. Temos alguns desafios, como sustentar a economia dinâmica e dependente de água. Se bem gerenciado o recurso hídrico, o Brasil tem potencial para atender a demanda de água para consumo humano e irrigação — afirmou.
Neves também cobrou a articulação entre União e estados, visto que apenas 7% das autorizações de uso da água vigentes são emitidas pela ANA, enquanto 93% são emitidas pelos estados.
— Precisamos de outorgas mais inteligentes, aquela que é dada olhando o território como um todo, dada de uma forma integrada para ser mais efetivo o balanço hídrico para aquela região. Os instrumentos das políticas de recursos hídricos e de saneamento têm os elementos para tornar eficiente a remoção de esgoto, o tratamento de efluentes, a disponibilização de água tratada à população. Tudo depende muito do modo de implantação dessas políticas, de forma mais integrada — afirmou.
De acordo com o coordenador-geral de Gestão de Recursos Hídricos do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), Anderson Bezerra, a pasta está atuando na integração das políticas ambientais e de recursos hídricos junto a outros ministérios e instituições.
Quanto à meta de universalização — de 99% da população com acesso à água potável e pelo menos 91% com acesso ao tratamento e à coleta de esgoto até 2033 — Bezerra afirmou que existem “gargalos e desafios” para o tratamento de esgoto nesse prazo, sobretudo na área rural, que só poderia ser atingido pela universalização até 2040, como estabelece o prazo adicional previsto pela própria legislação.
— A relação da saúde pública com água de qualidade é direta. É preciso avançar com o tratamento adequado. As estações convencionais de tratamento não têm capacidade de tratar micropoluentes. É preciso avançar com a revitalização de bacias, atualização das estações de tratamento, uso de membranas para refino e enxergar as populações rurais — afirmou.
Bezerra disse ainda que a educação ambiental com viés hídrico, aliada a campanhas de conscientização, pode mudar a cultura do desperdício de água no pais, sobretudo em razão das mudanças climáticas e eventos extremos, que já impõem mudanças no uso dos recursos naturais. Segundo ele, a segurança hídrica vai ocorrer não só com a universalização de atendimento, mas também com educação e ações de conservação das bacias hidrográficas.
O marco legal do saneamento trouxe um “ponto importante”, que é a uniformização das ações. A afirmação é do coordenador de Água e Economia Circular do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), André Melo, que ressaltou a importância do reaproveitamento da água e disse que os governos devem atuar na elaboração de um plano para situação de escassez e mudanças climáticas.
— Um tema importante é o reúso de agua, há um cenário propicio para o reúso, tem ainda um cenário de oferta, demanda, e capacidade de investir a longo prazo. Para pensar no reúso, tem que que ter perenidade dos recursos, se não, acaba. É importante sempre envolver toda comunidade. Quanto mais participativo for o processo de uso múltiplo da agua de reservatório, mais ajudará na operação de universalização adequada.
Segundo o coordenador-geral de Planejamento e Políticas de Recursos Hídricos do Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional (MIDR), Alexandre Saia, o governo pretende investir R$ 11,3 bilhões em infraestrutura hídrica. Os empreendimentos que vão contar com esses recursos foram indicados pelos próprios estados, e os investimentos atenderão grandes cidades onde a escassez hídrica tem afetado a população.
O representante do MIDR apontou a necessidade de investimentos em recuperação ambiental e proteção de aquíferos. Ele ressaltou que também serão aplicados recursos em proteção de bacias hidrográficas, medidas de adaptação às mudanças climáticas e projetos em zonas costeiras e estuarinas, ou seja, próximas a áreas onde os rios deságuam. Também destacou que a implementação do Plano Nacional de Recursos Hídricos ainda depende de aprovação do Conselho Nacional de Recursos Hídricos, que se encontra em fase de reinstalação, de acordo com nova estrutura do governo Federal.
— Ao mesmo tempo que devemos assegurar água para consumo humano, é preciso trabalhar com a proteção dos mananciais hídricos. A gente tem que criar a consciência hídrica. Somente no momento de escassez extrema se fala em economia de água e conservação. Tudo começa pela educação ambiental, tudo começa com a gestão dos recursos hídricos — afirmou.
Alexandre Saia também citou a política de dessalinização de água, por meio da qual poços abandonados do semi-árido estão sendo aproveitados para abastecer comunidades rurais, que já contam com mais de mil plantas em funcionamento utilizando a tecnologia.
Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)
Fonte: Agência Senado